7 de jan. de 2012
8 de dez. de 2011
Mia Araujo
queria morrer contigo
não queria morrer de ti
prendi o amor nos meus braços
mas uma chuva de areia negra
cospe o meu sangue onde o coração
queria morrer contigo(...)
não queria morrer de ti
a noite toda tem a espessura da perda
a boca beija o batimento da terra
o medo abraça-me
e ainda é tão tarde para que morramos os dois
Pedro Sena-Lino
Frida Kahlo
«Os dias longos, as noites no meio do mar. Espero o porto de chegada, as virtudes restituídas, o espírito enfim reconciliado com o mundo. E desembarco, há uma qualquer experiência surpreendente, caminho para o conhecimento. Consigo agarrar essa meada ainda irreconhecível: a maneira como tudo se enreda em tudo. Desabituei-me dos milagres. Sabe-se como é: quase todas as manhãs acordo angustiado, esforço-me por imaginar que este dia é virgem e primeiro, carregado de poderes enigmáticos, destinado às revelações. Literatura. Merda. Trata-se de mais um dia em que me vou chatear, aturar os meus semelhantes, a filha-da-putice teológico-emocional de um Deus que, ainda por cima, não existe. Posso especular sobre a revolução, evidentemente. Que revolução? A revolução, claro. Pois é: a minha revolução não dá um passo.»
Herberto Helder
http://triplov.com/letras/Marco-Silva/Passos-em-volta/Outros-valores.htm
Vacuumslayer Deviantart
“Eu sou o anjo do desespero”.
Eu sou o anjo do desespero.
Das minhas mãos distribuo a embriaguez,
a estupefacção, o esquecimento, gozo e
tormento dos corpos.
Meu discurso é o silêncio, meu canto o grito.
À sombra das minhas asas mora o terror.
Minha esperança é o último suspiro.
Minha esperança é a primeira batalha.
Eu sou a faca com que o morto arromba o seu caixão.
Eu sou aquele que será.
Meu descolar é a sublevação, meu céu o abismo de amanhã.
Mão Morta (Heiner Müller)
23 de jul. de 2011
4 de mar. de 2011
Sergio Niculitcheff
Penso na morte
mas sei que continuarei vivo no epicentro das flores
no abdômen ensangüentado doutros-corpos-meus
na concha húmida de tua boca em cima dos números mágicos
anunciando o ciclo das águas e o estado do tempo
A memória dos dias resiste no olhar dum retrato
continuo só
e sinto o peso do sorriso que não me cabe no rosto
improviso um vôo de alma sem rumo mas nada me consola
É imprevista a meteorologia das paixões
pássaros minerais afastam-se suspensos
vislumbro um corpo de chuva cintilando na areia
80Até que tudo se perde na sombra da noite... além
junto à salgada pele de longínquos ventos
AL BERTO
mas sei que continuarei vivo no epicentro das flores
no abdômen ensangüentado doutros-corpos-meus
na concha húmida de tua boca em cima dos números mágicos
anunciando o ciclo das águas e o estado do tempo
A memória dos dias resiste no olhar dum retrato
continuo só
e sinto o peso do sorriso que não me cabe no rosto
improviso um vôo de alma sem rumo mas nada me consola
É imprevista a meteorologia das paixões
pássaros minerais afastam-se suspensos
vislumbro um corpo de chuva cintilando na areia
80Até que tudo se perde na sombra da noite... além
junto à salgada pele de longínquos ventos
AL BERTO
Sergio Niculitcheff
Incêndio
"se conseguires entrar em casa e
alguém estiver em fogo na tua cama
e a sombra duma cidade surgir na cera do soalho
e do tecto cair uma chuva brilhante
contínua e miudinha - não te assustes
são os teus antepassados que por um momento
se levantaram da inércia dos séculos e vêm
visitar-te
diz-lhes que vives junto ao mar onde
zarpam navios carregados com medos
do fim do mundo - diz-lhes que se consumiu
a morada de uma vida inteira e pede-lhes
para murmurarem uma última canção para os olhos
e adormece sem lágrimas - com eles no chão"
Incêndio, de Al Berto, em Vigílias.
Sergio Niculitcheff, um grande artista brasileiro.
"O trabalho do artista é aprofundar sempre no mistério".
(Francis Bacon)
24 de set. de 2010
Carla Bedini
A Carlos Drummond de Andrade
Não há guarda-chuva
contra o poema
subindo de regiões onde tudo é surpresa
como uma flor mesmo num canteiro.
Não há guarda-chuva
contra o amor
que mastiga e cospe como qualquer boca,
que tritura como um desastre.
contra o amor
que mastiga e cospe como qualquer boca,
que tritura como um desastre.
Não há guarda-chuva
contra o tédio:
o tédio das quatro paredes, das quatro
estações, dos quatro pontos cardeais.
contra o tédio:
o tédio das quatro paredes, das quatro
estações, dos quatro pontos cardeais.
Não há guarda-chuva
contra o mundo
cada dia devorado nos jornais
sob as espécies de papel e tinta.
contra o mundo
cada dia devorado nos jornais
sob as espécies de papel e tinta.
Não há guarda-chuva
contra o tempo,
rio fluindo sob a casa, correnteza
carregando os dias, os cabelos.
contra o tempo,
rio fluindo sob a casa, correnteza
carregando os dias, os cabelos.
João Cabral de Melo Neto
Texto extraído do livro "João Cabral de Melo Neto - Obra completa", Editora Nova Aguilar - Rio de Janeiro, 1994, pág. 79.
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